domingo, 5 de maio de 2013

JORNAL REGIONAL - CRUZEIRO - SP - Artigo 1

Que bom estar de volta! Que sensação boa! Há aproximadamente 10 anos, eu me fazia presente aqui no Jornal Regional, em todas as edições, com minha coluna “Sonhos sobre trilhos”. Tenho guardado todas as publicações e confesso que não foram poucas as vezes que peguei a pasta com os recortes já amarelados pelo tempo e os reli, com saudade. Mudei-me de Cruzeiro, fiquei longe dos amigos e da minha cidade, mas ficava me perguntando sempre, se teria esta oportunidade novamente. E confesso que estou encantado com a ideia do retorno. Um sonho está se tornando realidade. Vale lembrar que os textos aqui compartilhados, foram escritos ao longo de mais de 25 anos e relatam “causos”, memórias, crônicas e histórias nascidas do tão rico folclore ferroviário. São cenários desenhados pela vida, ao lado das “linhas gêmeas de aço brilhante”, que enterneceram minha alma e coloriram minha existência. Venha comigo, o apito da locomotiva já ecoa nas encostas da serra e meu coração já bate acelerado, aguardando com avidez a chegada do trem na nossa estação. Boa viagem ! Bons sonhos ! Hoje quero fazer uma homenagem a alguém muito especial. Gozado, as pessoas passam pela vida da gente e a gente pela vida das pessoas e na maioria das vezes não nos damos conta da importância disso ! Mas em algum ponto da nossa existência, levados por circunstâncias nem sempre programadas ou previsíveis, fixamos a atenção em um determinado instante da nossa vida e percebemos a presença de pessoas que protagonizaram alguns capítulos inesquecíveis da nossa história. Permitam-me relatar algumas experiências de saudosas lembranças ?? Para isso vamos entrar no túnel do tempo e retornar ao passado. Meados da década de 70. O nosso cenário (como não poderia deixar de ser ), é a nossa bela Estação Ferroviária de Cruzeiro. O garotinho com a bandeja de salgadinhos... sou eu !



SR. ADOLPHO VITOR O CHEFE DE ESTAÇÃO DA REDE MINEIRA


“A estação fervilha de passageiros que apressados correm de um lado para outro, carregando (alguns arrastando) suas pesadas malas pela plataforma, ora em direção ao embarque nos trens da Central, ora buscando a plataforma da Rede Mineira. Em meio àquela agitação toda, um garotinho de pouco mais de 12 anos carrega uma bandeja de alumínio arredondada, coberta com um pano de prato branco com bordados nas extremidades, confeccionado a partir dos conhecidos sacos de algodão alvejados. A bandeja repleta de bolinhos de ovo (um ovo cozido, coberto de massa de farinha de trigo frita em óleo fervente), pesa nos franzinos braços do garotinho, e ao mesmo tempo lhe aquece a pele, obrigando-o a trocar de braço, enquanto caminha pela plataforma oferecendo o conhecido “engasga galo” aos passageiros. O gostoso cheiro do “sustancioso” salgado, aliado às argumentações espirituosas do jovem vendedor, garantiam absoluto sucesso nas vendas e logo estava ele, com a bandeja vazia e o bolso cheio de trocados que levava contente, entregando em seguida à mãe, para ajudar nas despesas da casa. E assim acontecia diariamente, nas chegadas e saídas dos trens. Naquele lado da estação (lado da RMV) , entre os afoitos passageiros que corriam de um lado para outro, chamava a atenção do garoto vendedor de salgadinhos, um personagem difícil de não ser notado. Com seu impecável terno de cor escura e sua elegante gravata, este era o Chefe da Estação de Cruzeiro. Lembro-me muito bem do seu olhar bonachão, a voz pausada, a educação em pessoa! Atento a tudo que acontecia ali, chamava nossa atenção, sobretudo quando desrespeitávamos as normas de segurança da ferrovia. Mas tudo isso sem agressividade, colocava a mão no nosso ombro, nos tratava com carinho e respeito. Isso fazia com que nós (quando digo nós refiro-me a mim e aos outros vendedores de salgados), sentíssemos uma profunda admiração pelo Chefe da Estação e o respeitávamos muito. Hoje, mais de 40 anos se passaram e a estação não mais registra aquele movimento todo. Está deserta, maltratada, triste... Não mais existem os trens nem os meninos vendedores de salgadinhos... O cenário, outrora agitado e alegre, hoje é só desolação, abandono, ruínas. Entretanto, toda vez que olho para a estação, minha mente foge da (triste) realidade e viaja no tempo, vivenciado aqueles áureos tempos. E me lembro do Sr. Adolpho Vitor, Chefe da Estação da Rede Mineira de Viação. Difícil é lembrar de tudo isso e não marejar os olhos de saudade... Sr. Vitor foi para nós, outrora vendedores de salgadinhos na estação de Cruzeiro, hoje com famílias formadas e preocupados com a formação dos nossos filhos, um grande exemplo de seriedade, educação e sobretudo respeito à dignidade do próximo. A forma enérgica, entretanto gentil e educada com que nos tratava, com certeza contribuiu para nossa educação e nortearam nossa postura diante da vida. Sr. Vitor, que bom que o senhor estava lá com a gente.

Nenhum comentário: